ARTIGO
Meningite meningocócica: por que se preocupar, quando suspeitar e como prevenir?

Esta matéria traz informações importantes sobre a meningite meningocócica, incluindo formas de transmissão, principais grupos de risco, sintomas, diagnóstico, tratamento e prevenção da doença.
A doença meningocócica é uma infecção que pode ser bastante grave, causada pela bactéria Neisseria meningitidis (Figura 1). É considerada uma emergência médica, pois se não for tratada rapidamente pode causar a morte em até 24 horas do início dos sintomas ou graves sequelas.1,2
Geralmente, essa infecção se apresenta como meningite, que é a inflamação das meninges (membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal), e/ou septicemia (infecção generalizada).1,3

Figura 1. Neisseria meningitidis, a bactéria que pode causar meningite meningocócica. (Adaptada de: Centers for Disease Control and Prevention. Public Health Image Library [Internet]. PHIL Photo ID# 22881)4
Formas de transmissão
A transmissão costuma ocorrer de pessoa para pessoa, através de gotículas contaminadas liberadas junto com a tosse, espirro, beijo e secreções do nariz. E quanto mais próximo ou prolongado o contato com a pessoa infectada, maior é o risco de ser contaminado (Figura 2).1,5

Figura 2. Pessoas com maior risco de infecção pelo contato mais próximo a um indivíduo doente. (Adaptado de: Centers for Disease Control and Prevention. Meningococcal Disease [Internet]5)
É importante saber que alguns indivíduos podem estar com a bactéria e não adoecer, mas ainda assim podem transmiti-la para outras pessoas.6
Grupos com maior risco de contrair a meningite meningocócica
Embora a doença meningocócica afete principalmente crianças com menos de 1 ano de idade, todos podem ser infectados, havendo também altas taxas da doença entre adolescentes e adultos, mesmo sem fatores de risco identificáveis.7,8
Entre os principais fatores de risco para ser infectado estão:
- Viver em ambientes comunitários (por exemplo, instalações militares, acampamentos infantis, dormitórios estudantis e presídios) ou participar de eventos com grande número de pessoas (por exemplo, Jogos Olímpicos).9,10
- Determinadas condições médicas, como:11
○ infecção por HIV,
○ asplenia (pessoas que não possuem baço, um órgão importante na defesa contra bactérias),
○ deficiências do sistema complemento (um dos sistemas de defesa do nosso organismo). - Viajar para áreas com alta prevalência da doença, como o cinturão de meningite na África Subsariana.12
Sintomas
No início, os sintomas podem ser confundidos com os de uma gripe, o que dificulta o diagnóstico.
Os sintomas clássicos da meningite meningocócica incluem início súbito de febre, dor de cabeça e rigidez do pescoço.3,6
Muitas vezes há outros sintomas, como: 3
- Náusea;
- Vômito;
- Fotofobia (aumento da sensibilidade à luz);
- Status mental alterado (confusão).
Com o passar do tempo, alguns sintomas mais graves podem aparecer, como convulsões, delírio, tremores e coma.3,6

ATENÇÃO! Bebês podem não apresentar esses sintomas clássicos ou, ainda, os sintomas podem estar presentes, mas são mais difíceis de serem percebidos. Em vez disso, os bebês podem:3,6
- ficar mais lentos ou inativos,
- ficar irritados e chorar mais que o normal,
- vomitar,
- se alimentar mal,
- ter uma protuberância na fontanela (a moleira fica abaulada),
- apresentar reflexos anormais (o médico pode identificar isso ao examinar o bebê).
Complicações
Se não tratada rapidamente, a meningite meningocócica pode resultar em:1

Tipos de meningite meningocócica
Existem diversos sorogrupos (tipos) da bactéria Neisseria meningitidis que podem causar meningite, sendo que os principais sorogrupos causadores de epidemias são: A, B, C, W, Y e, mais recentemente, X na África.2 No Brasil, os tipos que causam a maioria dos casos da doença são o B, C, W e Y.6
A recente disseminação do sorogrupo W, causou surtos no Reino Unido e diversos outros países europeus, além da África do Sul, Brasil, Argentina, Chile e Austrália.2,15,16
Prevenção
A prevenção contra a meningite meningocócica é feita através da vacinação. Não existe uma vacina universal, mas atualmente é possível prevenir 5 dos sorogrupos mais comuns (ABCWY). Entre as vacinas contra a meningite meningocócica estão as tetravalentes, que oferecem proteção contra 4 sorogrupos (ACWY) com apenas uma aplicação, assim como as monovalentes, que oferecem proteção apenas para 1 sorogrupo, havendo vacinas disponíveis contra os sorogrupos A, B ou C isoladamente.1,17
As recomendações de vacinação variam entre os diferentes países ao redor do mundo.18 No Brasil, as vacinas fazem parte do calendário de vacinação infantil e também são recomendadas (de acordo com o médico) para pessoas com algumas doenças crônicas, independentemente da idade.6,19 As Sociedades Brasileiras de Imunizações (SBIm) e de Pediatria (SBP) recomendam, sempre que possível, o uso da vacina meningocócica conjugada ACWY (MenACWY), além da meningocócica B.20
A proteção gerada pelas vacinas conjugadas (meningocócica C e ACWY) não é para toda a vida. O mesmo acontece com quem teve a doença, ou seja, a quantidade de anticorpos diminui ao longo do tempo e o indivíduo deixa de estar protegido, por isso a importância das doses de reforço.6,19
Veja abaixo os esquemas de vacinação recomendados pela SBIM e pela SBP:

Figura 3. Esquemas de vacinação contra meningite meningocócica recomendados pelas Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIM) e de Pediatria (SBP). De acordo com a SBIM, a vacinação de rotina contra meningite meningocócica deve iniciar aos 3 meses de idade, com duas doses no primeiro ano de vida (dependendo das recomendações das bulas) e reforço entre 12 e 15 meses, entre 5 e 6 anos e aos 11 anos de idade. No calendário da SBP, a diferença em relação à SBIm está no segundo reforço, que pode ser aplicado entre 4 e 6 anos, e no terceiro, entre 11 e 12 anos. *Para adolescentes que nunca receberam a vacina meningocócica conjugada - ACWY, são recomendadas duas doses com intervalo de 5 anos. Por exemplo, a primeira dose aos 11 anos e a segunda, aos 16. Para adultos, é recomendada dose única, dependendo do risco epidemiológico ou da condição de saúde. (Adaptado da Sociedade Brasileira de Imunizações, 2020,21 e Sociedade Brasileira de Pediatria, 202022).
A vacina meningocócica conjugada quadrivalente (ACWY) pode ser encontrada nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) para adolescentes entre 11 e 12 anos e nos serviços privados de vacinação para todas as faixas etárias.26
Estratégias de vacinação
Dentre as principais estratégias, estão:23
1. Vacinar a população com maior risco de desenvolver doença meningocócica.
2. Vacinar grupos etários (adolescentes) com maior taxa de portadores da bactéria, a fim de reduzir a transmissão a outros grupos ao longo do tempo.
3. Implementar ambas as estratégias.
Os adolescentes desempenham um papel importante como portadores e transmissores da bactéria meningocócica.2,23
Dessa forma, a escola pode ter um papel estratégico importante na verificação e manutenção da carteira de vacinação de crianças e adolescentes:24
- Solicitando uma cópia da carteira de vacinação da criança/adolescente no ato da matrícula.
- Organizando reuniões com os pais para avaliar as cadernetas de vacinação junto a profissionais da equipe de Saúde da Família.
A escola também pode contribuir educando sobre a importância da vacinação. Estudos brasileiros mostraram que há falta de conhecimento sobre o calendário de vacinação entre adolescentes, levando a baixas taxas de vacinação neste grupo. Após atividades de educação em saúde, houve um aumento nas taxas de vacinação nesses estudantes.25
- A meningite meningocócica é uma infecção bacteriana que pode apresentar sequelas graves.1
- Embora seja mais comum em crianças, também afeta adolescentes e outras faixas etárias.2,7,8
- Entre as vacinas que ajudam a prevenir a meningite meningocócica estão as tetravalentes, contra 4 sorogrupos (ACWY), recomendadas pelas Sociedades Brasileiras de Imunizações (SBIm) e de Pediatria (SBP).20
Compartilhar
-
Organização Mundial da Saúde.
Meningococcal meningitis [Internet] 2018.
Acesso em 11 jan 2021. Disponível em https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/meningococcal-meningitis. -
Presa J, Findlow J, Vojicic J, Williams S, Serra L.
Epidemiologic Trends, Global Shifts in Meningococcal Vaccination Guidelines, and Data Supporting the Use of MenACWY-TT Vaccine: A Review.
Infect Dis Ther. 2019 Sep;8(3):307-333. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal [Internet].
2019 Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/symptoms.html. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Public Health Image Library [Internet].
PHIL Photo ID# 22881. Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://phil.cdc.gov/Details.aspx?pid=22881. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/causes-transmission.html. -
Ministério da Saúde.
Meningite [Internet]. 2020.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z-1/m/meningite. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/surveillance/index.html. -
Martinón-Torres F.
Deciphering the Burden of Meningococcal Disease: Conventional and Under-recognized Elements.
J Adolesc Health 2016;59(2 Suppl):S12–20. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/outbreaks/index.html. -
Badahdah A-M, Rashid H, Khatami A, Booy R.
Meningococcal disease burden and transmission in crowded settings and mass gatherings other than Hajj/Umrah: A systematic review.
Vaccine 2018;36(31):4593–602. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/risk-medical.html. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/risk-travelers.html. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/prevention.html. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet]. 2017.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/diagnosis-treatment.html. -
European Centre for Disease Prevention and Control.
Factsheet about meningococcal disease [Internet].
Acesso em:11 jan 2021. Disponível em: https://www.ecdc.europa.eu/en/meningococcal-disease/factsheet. -
Mustapha MM, Marsh JW, Harrison LH.
Global epidemiology of capsular group W meningococcal disease (1970-2015): Multifocal emergence and persistence of hypervirulent sequence type (ST)-11 clonal complex.
Vaccine. 2016 Mar 18;34(13):1515-1523. -
Centers for Disease Control and Prevention.
Meningococcal Disease [Internet] 2017.
Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/vaccines/vpd/mening/public/index.html. -
Ali A, Jafri RZ, Messonnier N, et al.
Global practices of meningococcal vaccine use and impact on invasive disease.
Pathog Glob Health 2014;108(1):11–20. -
Sociedade Brasileira de Imunizações.
Perguntas e respostas [Internet]. 2020.
Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://familia.sbim.org.br/vacinas/perguntas-e-respostas/meningite. -
Sociedade Brasileira de Imunizações e Sociedade Brasileira de Pediatria.
NOTA TÉCNICA CONJUNTA – SBIm/SBP - 11/07/2018.
Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://sbim.org.br/images/files/ntconjunta-sbimsbp-vacinas-meningo-brasil-2018.pdf. -
Sociedade Brasileira de Imunizações.
Do Nascimento aos 19 anos Calendário de vacinação 2020-2021.
Acesso em 26/02/2021. Disponível em: https://sbim.org.br/images/calendarios/calend-pg-crianca-adolesc-0-19.pdf. -
Sociedade Brasileira de Pediatria.
Calendário de Vacinação da SBP 2020.
Acesso em 26/02/2021. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/22268g-DocCient-Calendario_Vacinacao_2020.pdf. -
Vetter V, Baxter R, Denizer G, Sáfadi MA, Silfverdal SA, Vyse A, Borrow R.
Routinely vaccinating adolescents against meningococcus: targeting transmission & disease.
Expert Rev Vaccines. 2016 May;15(5):641-58. -
Ministério da Saúde.
Departamento de Atenção Básica.
Passo a passo PSE- Programa da saúde na escola. Brasília: Ed. Ministério da Saúde, 2011. Acesso em: 26/02/2021. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/legislacao/passo_a_passo_pse.pdf. -
Viegas SMF et al.
A vacinação e o saber do adolescente: educação em saúde e ações para a imunoprevenção.
Ciênc. saúde coletiva [online]. 2019, 24(2): 351-360. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232019000200351&lng=en&nrm=iso. -
Sociedade Brasileira de Imunizações.
Vacina Meningocócica conjugada quadrivalente — ACWY, atualização de 30/06/2020.
Acesso em 04/Jan/2021. Disponível em https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-meningococica-conjugada-acwy.
Referências