ARTIGO

Meningite meningocócica: por que se preocupar, quando suspeitar e como prevenir?

Publicado

Jun/2023

12 min

Hero

Esta matéria traz informações importantes sobre a meningite meningocócica, incluindo formas de transmissão, principais grupos de risco, sintomas, diagnóstico, tratamento e prevenção da doença.

A doença meningocócica é uma infecção que pode ser bastante grave, causada pela bactéria Neisseria meningitidis (Figura 1).  É considerada uma emergência médica, pois se não for tratada rapidamente pode causar a morte em até 24 horas do início dos sintomas ou graves sequelas.1,2

Geralmente, essa infecção se apresenta como meningite, que é a inflamação das meninges (membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal), e/ou septicemia (infecção generalizada).1,3 

Imagem borda

Figura 1. Neisseria meningitidis, a bactéria que pode causar meningite meningocócica. (Adaptada de: Centers for Disease Control and Prevention. Public Health Image Library [Internet]. PHIL Photo ID# 22881)4
 

Formas de transmissão

A transmissão costuma ocorrer de pessoa para pessoa, através de gotículas contaminadas liberadas junto com a tosse, espirro, beijo e secreções do nariz. E quanto mais próximo ou prolongado o contato com a pessoa infectada, maior é o risco de ser contaminado (Figura 2).1,5

Grafico 01

Figura 2. Pessoas com maior risco de infecção pelo contato mais próximo a um indivíduo doente. (Adaptado de: Centers for Disease Control and Prevention. Meningococcal Disease [Internet]5)

É importante saber que alguns indivíduos podem estar com a bactéria e não adoecer, mas ainda assim podem transmiti-la para outras pessoas.6

Grupos com maior risco de contrair a meningite meningocócica

Embora a doença meningocócica afete principalmente crianças com menos de 1 ano de idade, todos podem ser infectados, havendo também altas taxas da doença entre adolescentes e adultos, mesmo sem fatores de risco identificáveis.7,8 

Entre os principais fatores de risco para ser infectado estão:

  • Viver em ambientes comunitários (por exemplo, instalações militares, acampamentos infantis, dormitórios estudantis e presídios) ou participar de eventos com grande número de pessoas (por exemplo, Jogos Olímpicos).9,10
  • Determinadas condições médicas, como:11
    ○ infecção por HIV,
    ○ asplenia (pessoas que não possuem baço, um órgão importante na defesa contra bactérias),
    ○ deficiências do sistema complemento (um dos sistemas de defesa do nosso organismo).
  • Viajar para áreas com alta prevalência da doença, como o cinturão de meningite na África Subsariana.12

Sintomas

No início, os sintomas podem ser confundidos com os de uma gripe, o que dificulta o diagnóstico.
Os sintomas clássicos da meningite meningocócica incluem início súbito de febre, dor de cabeça e rigidez do pescoço.3,6

Muitas vezes há outros sintomas, como: 3

  • Náusea;
  • Vômito;
  • Fotofobia (aumento da sensibilidade à luz);
  • Status mental alterado (confusão).

Com o passar do tempo, alguns sintomas mais graves podem aparecer, como convulsões, delírio, tremores e coma.3,6

Grafico 03

ATENÇÃO! Bebês podem não apresentar esses sintomas clássicos ou, ainda, os sintomas podem estar presentes, mas são mais difíceis de serem percebidos. Em vez disso, os bebês podem:3,6

  • ficar mais lentos ou inativos,
  • ficar irritados e chorar mais que o normal,
  • vomitar,
  • se alimentar mal,
  • ter uma protuberância na fontanela (a moleira fica abaulada),
  • apresentar reflexos anormais (o médico pode identificar isso ao examinar o bebê).

Complicações

Se não tratada rapidamente, a meningite meningocócica pode resultar em:1

Grafico 04

Tipos de meningite meningocócica

Existem diversos sorogrupos (tipos) da bactéria Neisseria meningitidis que podem causar meningite, sendo que os principais sorogrupos causadores de epidemias são: A, B, C, W, Y e, mais recentemente, X na África.2 No Brasil, os tipos que causam a maioria dos casos da doença são o B, C, W e Y.6

A recente disseminação do sorogrupo W, causou surtos no Reino Unido e diversos outros países europeus, além da África do Sul, Brasil, Argentina, Chile e Austrália.2,15,16

Prevenção

A prevenção contra a meningite meningocócica é feita através da vacinação. Não existe uma vacina universal, mas atualmente é possível prevenir 5 dos sorogrupos mais comuns (ABCWY). Entre as vacinas contra a meningite meningocócica estão as tetravalentes, que oferecem proteção contra 4 sorogrupos (ACWY) com apenas uma aplicação, assim como as monovalentes, que oferecem proteção apenas para 1 sorogrupo, havendo vacinas disponíveis contra os sorogrupos A, B ou C isoladamente.1,17

As recomendações de vacinação variam entre os diferentes países ao redor do mundo.18 No Brasil, as vacinas fazem parte do calendário de vacinação infantil e também são recomendadas (de acordo com o médico) para pessoas com algumas doenças crônicas, independentemente da idade.6,19 As Sociedades Brasileiras de Imunizações (SBIm) e de Pediatria (SBP) recomendam, sempre que possível, o uso da vacina meningocócica conjugada ACWY (MenACWY), além da meningocócica B.20

A proteção gerada pelas vacinas conjugadas (meningocócica C e ACWY) não é para toda a vida. O mesmo acontece com quem teve a doença, ou seja, a quantidade de anticorpos diminui ao longo do tempo e o indivíduo deixa de estar protegido, por isso a importância das doses de reforço.6,19

Veja abaixo os esquemas de vacinação recomendados pela SBIM e pela SBP: 

Grafico 05

Figura 3. Esquemas de vacinação contra meningite meningocócica recomendados pelas Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIM) e de Pediatria (SBP). De acordo com a SBIM, a vacinação de rotina contra meningite meningocócica deve iniciar aos 3 meses de idade, com duas doses no primeiro ano de vida (dependendo das recomendações das bulas) e reforço entre 12 e 15 meses, entre 5 e 6 anos e aos 11 anos de idade. No calendário da SBP, a diferença em relação à SBIm está no segundo reforço, que pode ser aplicado entre 4 e 6 anos, e no terceiro, entre 11 e 12 anos. *Para adolescentes que nunca receberam a vacina meningocócica conjugada - ACWY, são recomendadas duas doses com intervalo de 5 anos. Por exemplo, a primeira dose aos 11 anos e a segunda, aos 16. Para adultos, é recomendada dose única, dependendo do risco epidemiológico ou da condição de saúde. (Adaptado da Sociedade Brasileira de Imunizações, 2020,21 e Sociedade Brasileira de Pediatria, 202022).

A vacina meningocócica conjugada quadrivalente (ACWY) pode ser encontrada nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) para adolescentes entre 11 e 12 anos e nos serviços privados de vacinação para todas as faixas etárias.26

Estratégias de vacinação

Dentre as principais estratégias, estão:23
1. Vacinar a população com maior risco de desenvolver doença meningocócica.
2. Vacinar grupos etários (adolescentes) com maior taxa de portadores da bactéria, a fim de reduzir a transmissão a outros grupos ao longo do tempo.
3. Implementar ambas as estratégias.

Os adolescentes desempenham um papel importante como portadores e transmissores da bactéria meningocócica.2,23

Dessa forma, a escola pode ter um papel estratégico importante na verificação e manutenção da carteira de vacinação de crianças e adolescentes:24

  • Solicitando uma cópia da carteira de vacinação da criança/adolescente no ato da matrícula.
  • Organizando reuniões com os pais para avaliar as cadernetas de vacinação junto a profissionais da equipe de Saúde da Família.

A escola também pode contribuir educando sobre a importância da vacinação. Estudos brasileiros mostraram que há falta de conhecimento sobre o calendário de vacinação entre adolescentes, levando a baixas taxas de vacinação neste grupo. Após atividades de educação em saúde, houve um aumento nas taxas de vacinação nesses estudantes.25

  • A meningite meningocócica é uma infecção bacteriana que pode apresentar sequelas graves.1
  • Embora seja mais comum em crianças, também afeta adolescentes e outras faixas etárias.2,7,8
  • Entre as vacinas que ajudam a prevenir a meningite meningocócica estão as tetravalentes, contra 4 sorogrupos (ACWY), recomendadas pelas Sociedades Brasileiras de Imunizações (SBIm) e de Pediatria (SBP).20

Compartilhar

    Referências

    1. Organização Mundial da Saúde.
      Meningococcal meningitis [Internet] 2018.
      Acesso em 11 jan 2021. Disponível em https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/meningococcal-meningitis.

    2. Presa J, Findlow J, Vojicic J, Williams S, Serra L.
      Epidemiologic Trends, Global Shifts in Meningococcal Vaccination Guidelines, and Data Supporting the Use of MenACWY-TT Vaccine: A Review.
      Infect Dis Ther. 2019 Sep;8(3):307-333.

    3. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal [Internet].
      2019 Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/symptoms.html.

    4. Centers for Disease Control and Prevention.
      Public Health Image Library [Internet].
      PHIL Photo ID# 22881. Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://phil.cdc.gov/Details.aspx?pid=22881.

    5. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/causes-transmission.html.

    6. Ministério da Saúde.
      Meningite [Internet]. 2020.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z-1/m/meningite.

    7. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/surveillance/index.html.

    8. Martinón-Torres F.
      Deciphering the Burden of Meningococcal Disease: Conventional and Under-recognized Elements.
      J Adolesc Health 2016;59(2 Suppl):S12–20.

    9. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/outbreaks/index.html.

    10. Badahdah A-M, Rashid H, Khatami A, Booy R.
      Meningococcal disease burden and transmission in crowded settings and mass gatherings other than Hajj/Umrah: A systematic review.
      Vaccine 2018;36(31):4593–602.

    11. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/risk-medical.html.

    12. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/risk-travelers.html.

    13. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2019.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/prevention.html.

    14. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet]. 2017.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/meningococcal/about/diagnosis-treatment.html.

    15. European Centre for Disease Prevention and Control.
      Factsheet about meningococcal disease [Internet].
      Acesso em:11 jan 2021. Disponível em: https://www.ecdc.europa.eu/en/meningococcal-disease/factsheet.

    16. Mustapha MM, Marsh JW, Harrison LH.
      Global epidemiology of capsular group W meningococcal disease (1970-2015): Multifocal emergence and persistence of hypervirulent sequence type (ST)-11 clonal complex.
      Vaccine. 2016 Mar 18;34(13):1515-1523.

    17. Centers for Disease Control and Prevention.
      Meningococcal Disease [Internet] 2017.
      Acesso em: 11 jan 2021. Disponível em: https://www.cdc.gov/vaccines/vpd/mening/public/index.html.

    18. Ali A, Jafri RZ, Messonnier N, et al.
      Global practices of meningococcal vaccine use and impact on invasive disease.
      Pathog Glob Health 2014;108(1):11–20.

    19. Sociedade Brasileira de Imunizações.
      Perguntas e respostas [Internet]. 2020.
      Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://familia.sbim.org.br/vacinas/perguntas-e-respostas/meningite.

    20. Sociedade Brasileira de Imunizações e Sociedade Brasileira de Pediatria.
      NOTA TÉCNICA CONJUNTA – SBIm/SBP - 11/07/2018.
      Acesso em 11 jan 2021. Disponível em: https://sbim.org.br/images/files/ntconjunta-sbimsbp-vacinas-meningo-brasil-2018.pdf.

    21. Sociedade Brasileira de Imunizações.
      Do Nascimento aos 19 anos Calendário de vacinação 2020-2021.
      Acesso em 26/02/2021. Disponível em: https://sbim.org.br/images/calendarios/calend-pg-crianca-adolesc-0-19.pdf.

    22. Sociedade Brasileira de Pediatria.
      Calendário de Vacinação da SBP 2020.
      Acesso em 26/02/2021. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/22268g-DocCient-Calendario_Vacinacao_2020.pdf.

    23. Vetter V, Baxter R, Denizer G, Sáfadi MA, Silfverdal SA, Vyse A, Borrow R.
      Routinely vaccinating adolescents against meningococcus: targeting transmission & disease.
      Expert Rev Vaccines. 2016 May;15(5):641-58.

    24. Ministério da Saúde.
      Departamento de Atenção Básica.
      Passo a passo PSE- Programa da saúde na escola. Brasília: Ed. Ministério da Saúde, 2011. Acesso em: 26/02/2021. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/legislacao/passo_a_passo_pse.pdf.

    25. Viegas SMF et al.
      A vacinação e o saber do adolescente: educação em saúde e ações para a imunoprevenção.
      Ciênc. saúde coletiva [online]. 2019, 24(2): 351-360. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232019000200351&lng=en&nrm=iso.

    26. Sociedade Brasileira de Imunizações.
      Vacina Meningocócica conjugada quadrivalente — ACWY, atualização de 30/06/2020.
      Acesso em 04/Jan/2021. Disponível em https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-meningococica-conjugada-acwy.