ARTIGO

Erradicação de doenças infantis com vacinação

Publicado

Jun/2021

13 min

Pai segurando bebê no colo esperando aplicação da vacina contra doenças infantis

Vamos abordar doenças infantis que foram erradicadas ou estão em processo de erradicação no Brasil, como pólio, sarampo, difteria, rubéola e outras, e a importância da vacinação nesse processo.

Vacinas salvam vidas

Para falar sobre a importância da vacinação para a saúde das crianças e erradicação de doenças, convidamos o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, que também é especialista em pediatria e autor de diversos livros sobre vacinação e pediatria. Ele nos conta como a peste negra foi um marco histórico e fala sobre outras epidemias que assolaram o mundo depois dela, como a malária, cólera, tuberculose, varíola, gripe e sarampo.

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“As campanhas para erradicação da varíola serviram como modelo para as campanhas nacionais de vacinação a fim de controlar ou eliminar outras doenças. Para se ter uma ideia, nosso PNI (Plano Nacional de Imunização) teve início na década de 1970 com poucas vacinas: além da BCG, que é contra a tuberculose, tivemos também vacina oral  contra a poliomielite, a vacina contra o sarampo e a tríplice bacteriana – DPT, que combate a difteria, pertússis (coqueluche) e tétano. Com a utilização dessas vacinas, que transformaram doenças infantis que acometiam todo o mundo, conseguiu-se levar o recado para toda a população e comunidade científica, mostrando o valor das imunizações.”

Como surgiu a primeira vacina?

A primeira vacina surgiu no século 18, em uma tentativa de frear o avanço da varíola. Apesar de ser uma doença milenar, surtos da doença foram apontados como fatores prejudiciais ao desenvolvimento da Europa na Idade Média. Ao chegar nas Américas, foi fundamental para dizimar as populações incas e astecas, altamente sensíveis a doenças novas. O mesmo ocorreu com a população nativa dos EUA.1
A proliferação da doença foi o fator essencial para o surgimento da primeira vacina. O médico inglês Edward Jenner, utilizando os conhecimentos da época, percebeu que pessoas infectadas com o vírus vaccinia (varíola bovina) ficavam imunes e tinham sintomas mais leves do que os infectados com a varíola humana. Foi então que começou a inoculação de vírus vivo em pessoas saudáveis, para o surgimento de anticorpos. Foi o início rudimentar da vacina que conhecemos hoje.1
Foram séculos de desenvolvimento científico até que o mundo conseguisse erradicar a varíola e controlar outras doenças, como pólio, sarampo e rubéola. “Essas vacinas criadas inicialmente foram importantes para o Brasil e temos um caso de sucesso, que é a vacina contra a poliomielite. O último caso da doença foi em 1989, já o sarampo foi eliminado em 2016, mas, infelizmente, voltou em 2018, e a rubéola congênita foi eliminada em 2016”, disse Juarez Cunha.

Lutas vencidas e batalhas antigas

O pediatra conta como o sucesso da vacinação contra a pólio foi fundamental para a conscientização vacinal no Brasil. Ela vai além dos trabalhos médicos e passa pela comunicação, com uso de personagens cativantes como o Zé Gotinha e a disponibilização de imunizantes nos lugares mais remotos do país.
“Tivemos campanhas contra a pólio na década de 1980 e 1990 que se mantêm até hoje. Na década de 1990, começam as campanhas de vacina contra a gripe, que também se mantêm até hoje. Tivemos várias outras campanhas nesse período, como a de rubéola em 2008 e as campanhas do sarampo que, no geral, são repetidas a cada quatro ou cinco anos. O próprio retorno do sarampo em 2018 levou o PNI a fazer várias campanhas direcionadas a diferentes faixas etárias. Também temos a campanha de multivacinação, para estimular a retirada dos os atrasos vacinais. É claro que com essas campanhas especiais, quando são bem divulgadas, a gente consegue ótimos resultados. Também sabemos que, muitas vezes, as pessoas procuram a vacina de forma acentuada por causa do medo, como ocorreu recentemente com o aumento de casos de febre amarela. Não é algo que desejamos, pois a ideia é que todos estejam com sua vacinação em dia e não precisemos de campanhas adicionais.”

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Movimento antivacina e a volta de doenças

Assim como ocorreu na época de Oswaldo Cruz, o movimento antivacina é uma constante na saúde pública nacional. Por muitos anos, esse grupo ocupava um espaço significativo, mas com a intensificação das fake news nos últimos anos, a comunidade médica tem acendido o sinal de alerta a respeito da cobertura vacinal.
“O movimento antivacina nos preocupa. A desinformação, as fake news e esse movimento estão interligados. Apesar de sempre termos falado que era um movimento fraco, ele já estava crescente e, com a vacina que protege contra a COVID-19, é impressionante como a desinformação aumentou”, disse.
De acordo com o médico, com o assunto vacina em todos os noticiários, as notícias falsas se alastraram e não se limitam à vacina contra a COVID-19. “Esse foi e é um dos fatores que diminuíram nossas coberturas vacinais, fazendo com que a gente não alcance aqueles 90% ou 95% que tanto se procura atingir nas crianças. Com isso, o risco de as doenças voltarem se torna cada vez mais importante”, ressaltou.
Um exemplo prático é o retorno do sarampo em 2018. Segundo Juarez, a doença voltou no Brasil porque nossas coberturas vacinais estavam abaixo do indicado. Em 2020, o Ministério da Saúde divulgou um alerta sobre casos de difteria no Peru, com quatro casos confirmados e um óbito. O fato chamou a atenção porque o país não apresentava casos há mais de 20 anos.2
No mesmo ano, o Brasil teve dois casos confirmados nas cidades de Timóteo (MG) e Uruguaiana (RS), sem nenhum óbito. O que são casos isolados podem gerar um surto se a cobertura vacinal não for melhorada.2

Você sabia?

67% dos brasileiros acreditam em informações falsas sobre vacinação

O achado é parte do estudo As fake news estão nos deixando doentes?, divulgado em 2018 pela Avaaz, em parceria com a SBIm, com o objetivo de investigar a associação entre a desinformação e a queda nas coberturas vacinais verificadas nos últimos anos.3
Há ainda evidências de que as notícias falsas tenham impactado a decisão de não se vacinar. Entre os que não se vacinaram, 57% relataram pelo menos um motivo considerado como desinformação.3
Os mais comuns, nesta ordem, foram: não achei a vacina necessária (31%); medo de ter efeitos colaterais graves após tomar uma vacina (24%); medo de contrair a doença que estava tentando prevenir com a vacina (18%); por causa das notícias, histórias ou alertas que li online (9%) e por causa dos alertas, notícias e histórias de líderes religiosos (4%).3

Efeito Covid-19

Outro fator que preocupa a comunidade médica é a baixa procura por vacinação infantil em tempos de pandemia. O medo da COVID-19 tem feito com que muitos pais fiquem em casa quando deveriam providenciar a imunização de seus filhos.
“Com o retorno às aulas presenciais e a possibilidade de maior circulação após o fim da pandemia, há o receio de que doenças eliminadas ou controladas possam reaparecer. Várias doenças são de transmissão respiratória”, disse Juarez.
Segundo ele, a baixa procura vacinal é baseada em três fatores, chamados de três C’s:
• Confiança: a falta de confiança nas vacinas, no governo ou nos profissionais da saúde;
• Conveniência: dificuldade de acessar postos de saúde por causa da localização, horário disponível e até falta de vacinas;
• Complacência: a falsa sensação de segurança com relação a doenças que não circulam mais e sobre as quais há certo desconhecimento. 

“Com a pandemia, as pessoas entenderam as orientações de distanciamento social como um recado de que não deveriam ir às unidades de saúde e muitas das que foram, tinham medo de contrair COVID-19. Com certeza isso atrapalhou ainda mais nossas coberturas vacinais, tanto que em abril de 2020, preocupados com isso, fizemos uma campanha para vacinação mesmo durante a pandemia”.

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Campanha vacinal de 2020, em plena pandemia de Covid-19. Foto: Divulgação

O especialista explica que as vacinas precisam estar em dia, sempre com a segurança e os protocolos exigidos em tempos de pandemia. “Essas regras já são conhecidas e simples de seguir: lavar as mãos, usar máscaras e evitar aglomerações em qualquer atividade. Pensando pelo outro lado, o profissional da saúde também tem que trabalhar com segurança e equipamentos adequados. “A vacinação é essencial, tem que ser mantida e estimulada”.

Quais vacinas meu filho deve tomar?

A Sociedade Brasileira de Imunizações, presidida por Juarez, divulga todos os anos o calendário vacinal para todas as idades. Confira quais são as vacinas indicadas até os 19 anos4 em:

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    Referências

    1. Riedel S. Edward Jenner and the history of smallpox and vaccination.
      Proc (Bayl Univ Med Cent). 2005;18(1):21-25.
      Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1200696/. Acesso em: 2021, abril.

    2. Prefeitura de São Paulo e Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo.
      Alerta Difteria OPAS E Ministério da Saúde alertam para ocorrência de casos de difteria na região das Américas, em especial, no Peru, nas semanas 44 e 45/2020
      disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/alerta_difteria_covisa_2020.pdf. Acesso em: 2021, abril.

    3. Disponível em: https://sbim.org.br/images/files/po-avaaz-relatorio-antivacina.pdf.
      Sociedade Brasileira de Imunizações. As Fake News estão nos deixando doentes?
      Acesso em: 2021, abril.

    4. Disponível em: https://sbim.org.br/images/calendarios/calend-pg-crianca-adolesc-0-19.pdf.
      Sociedade Brasileira de Imunizações. Calendário vacinal crianças e adolescentes de 0 a 19 anos.
      Acesso em: 2021, abril.